#AgoraÉQueSãoElas https://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br Um espaço para mulheres em movimento Wed, 15 Apr 2020 11:52:04 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 A luz que vem de fora https://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/2018/07/16/a-luz-que-vem-de-fora/ https://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/2018/07/16/a-luz-que-vem-de-fora/#respond Mon, 16 Jul 2018 13:50:03 +0000 https://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/files/2018/07/politica-678x381-320x213.jpg http://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/?p=1513 *Por Jandira Feghali

Nem tudo tem sido derrota nas terras de sangue latino. Tal qual o rubro das bandeiras da esquerda, México e Espanha viraram poderosos holofotes vermelhos na escuridão que sombreia Brasil, Argentina e tantas outras nações amortecidas pela direita política. A lição democrática que chegou aos governos da Espanha e México, com os líderes Pedro Sanchez e López Obrador mostrou ao mundo que é necessário se fazer política sim com paridade de gênero. O México ainda teve a façanha de eleger a primeira mulher como comandante da Cidade do México, a física e engenheira elétrica Claudia Sheinbaum. Por sua vez, Pedro tem maioria de mulheres em seu governo e Obrador formou metade de seu gabinete principal com elas. Que exemplo!

Realidades bem distantes do Brasil, é claro, que ocupa o 161° lugar em ranking da presença de mulheres no Poder Executivo, segundo o Projeto Mulheres Inspiradoras de 2018. A derrubada da presidenta Dilma Rousseff (primeira mulher eleita presidente em nossa História), em 2016, num golpe parlamentar, deu ao nosso país essa vitrine vergonhosa de Temer e sua corja. Hoje, um governo majoritariamente masculino, branco, rico, e envolvido em escândalos de corrupção. Cheira a mofo, atraso e aspirante à colônia de império, não só na teoria, como na prática. Pobre país o nosso!

O frescor que emana dos países que valorizam a participação das mulheres na política tem que ser fortalecido por aqui também. As eleições de outubro precisam resgatar a realidade brasileira, onde mais da metade da nossa população é composta por mulheres. Por que sermos apenas 10% do Parlamento se somos milhões no Brasil? Dá pra manter este estado de coisas? Quantas mulheres formidáveis e representativas poderiam estar eleitas e promovendo a política como ferramenta maior de transformação social? Precisamos mudar o perfil do poder em todas as esferas através do voto e de ocupações políticas, que superem a desigualdade e enfrentem a opressão de gênero. Coragem, ousadia e luta! Vamos nessa, mulheres!

Uma poderosa campanha da sociedade civil organizada, de coletivos feministas e da mídia independente, batizada de “Campanha de Mulher” (www.campanhademulher.org), tem levantado essa questão com força ao divulgar pré-candidatas em todos os estados. Ações como essa, se fortalecidas e abraçadas pela população, poderão mudar o horizonte de 2019.

Desde a redemocratização, caminhamos muito até aqui. Na Câmara dos Deputados criamos a bancada feminina – um dia já batizada pejorativamente de “bancada do batom” – e lutamos fortemente para que temas ligados à saúde, educação, trabalho e direitos de gênero fossem melhor analisados no Congresso Nacional. A Lei Maria da Penha, um enorme avanço legislativo que pude escrever seu texto final, virou realidade e hoje protege milhões de brasileiras. Até a cota de 30% em participação feminina nas eleições, da senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB/AM), chegou a ser aprovada no Senado Federal, restando decisão final da Câmara. São exemplos de que nunca foi fácil, mas tivemos muitas vitórias nesse caminho. E sempre fomos poucas… imagina se essa realidade fosse diferente? O quanto já teríamos conquistado em Brasília e nas assembleias legislativas Brasil a fora?

Que outubro responda à renovação política que tocou o México e a Espanha. Para avançarmos mais, para chegarmos mais longe. Juntas.

*Jandira Feghali é médica, deputada federal (PCdoB/RJ) e relatora da Lei Maria da Penha

]]> 0 Um retrato da mídia contra as mulheres na política https://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/2018/07/09/um-retrato-da-midia-contra-as-mulheres-na-politica/ https://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/2018/07/09/um-retrato-da-midia-contra-as-mulheres-na-politica/#respond Mon, 09 Jul 2018 15:54:51 +0000 https://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/files/2018/07/WhatsApp-Image-2018-07-09-at-12.15.27-320x213.jpeg http://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/?p=1501


por Lisete Arelaro*

 

Há pouco tempo atrás, ainda no século XX, pensar que uma mulher poderia ocupar espaços de poder na política era algo inimaginável para a maioria da população. Felizmente, décadas de luta das mulheres por direitos, liberdade, igualdade e representatividade mudaram esse quadro e hoje a pauta do protagonismo feminino é evidente em todos os espaços. Nas eleições deste ano, a participação das mulheres e a identificação com a pauta feminista é tema de destaque.

 

Aos que ignoram essa presença e este debate vejo duas possibilidades: uma alienação completa aos temas da atualidade ou uma ação intencional pela manutenção da supremacia masculina, sobretudo nos espaços de poder e decisão.

 

Parte da imprensa paulista parece se alinhar com esse segundo grupo. Pretendem falar de política e dos acontecimentos fingindo que a desigualdade de gênero não existe. Pior ainda, reproduzindo-a.

 

A direção da TV Cultura, uma rede pública de televisão, decidiu me deixar de fora da sua série de entrevistas no programa Roda Viva com os pré-candidatos ao governo de SP, mesmo sendo a única mulher pré-candidata. O mesmo Roda Viva que protagonizou o deplorável espetáculo de machismo e preconceito contra a pré-candidata à presidência da República, Manuela D’Ávila.

 

Recentemente, essa política de exclusão já tinha sido feita pelo SBT, Folha de S. Paulo e UOL que não me convidaram para sua série de sabatinas, realizadas durante o mês de maio. Além de única mulher, sou pré-candidata pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), um partido que tem feito um destacado, corajoso e importante enfrentamento à velha política, à reprodução das desigualdades e à retirada de direitos por meio de seus representantes nas casas legislativas. Penso ser importante, contudo, apontar alguns aspectos que legitimam a minha presença na cobertura do processo eleitoral do estado de São Paulo.

 

Vale lembrar que no campo jurídico, mais especificamente no campo da justiça  eleitoral, está previsto que todos os partidos deverão ter, no mínimo, 30% de candidatas mulheres. Além disso, os recursos financeiros e o tempo de TV destinado às mulheres também deve respeitar, no mínimo, essa proporção. O que fundamenta essas determinações legais é a constatação da sub-representação das mulheres nos espaços de poder e a pressão das mulheres por ações afirmativas que busquem enfrentar o machismo. Em uma democracia se faz imperativo a presença e representação das mulheres.

 

Uma retrospectiva rápida nos mostra que no Brasil e no mundo as mulheres tem protagonizado lutas e resistência, provocando mudanças e reflexão sobre as estruturas machistas que nos permeiam nos espaços privados e nos espaços públicos. Tratam-se de lutas que interferem decisivamente na história de seus países, como podemos lembrar da importância das mulheres na derrubada do deputado Eduardo Cunha ou da presença das mulheres nas categorias que resistiram à Reforma da Previdência, assim como a gigantesca mobilização das mulheres argentinas em defesa da legalização do aborto e a Marcha das Mulheres contra Trump nos EUA e em outros países.

 

O assassinato brutal da vereadora Marielle Franco, no Rio de Janeiro mostrou de forma trágica que o racismo, o machismo e a lesbofobia seguem fortes e presentes no Brasil. Uma mulher negra, vinda da favela da Maré, lésbica e de esquerda não foi tolerada no espaço de poder dos homens brancos e poderosos. Não foi tolerada no meio interno da política por defender os direitos humanos, por defender vidas negras, vidas pobres, vidas LGBTs e enfrentar a violência sistêmica carioca. Talvez pelo mesmo motivo, vale destacar que Marielle não foi amplamente conhecida do grande público enquanto viva por essa atuação. Quantos jornais, quantas emissoras, quantos sites destacaram sua eleição, sua atuação na Câmara do Rio, seus enfrentamentos e sua coragem neste ambiente hostil às mulheres que é a política? Que efeito importante tem a repercussão da atuação de vereadoras como Marielle para a formação política de nossas mulheres, nossa juventude?

 

Marielle ficou nacionalmente conhecida por sua trágica morte. Mas Marielle segue  presente em cada uma de nós. E segue espantoso que passados mais de 100 dias de sua execução sem nenhuma resposta, parte da imprensa segue ignorando os mecanismos de exclusão das mulheres – sobretudo as negras – dos espaços públicos.

 

Por fim, o suposto critério adotado pelos veículos de comunicação citados – de convidar apenas os quatro melhores posicionados nas pesquisas para as entrevistas escanteia justamente os candidatos com propostas alternativas, fora do rol tradicional da política e dos discursos e práticas tão conhecidas – e recorrentemente desaprovadas – de nossa população. No caso em especial da TV Cultura, nem mesmo esse argumento se sustenta, uma vez que segundo a última pesquisa Ibope estou empatada tecnicamente em terceiro lugar.

 

Pode-se afirmar que há um desejo de ver a política de forma diferente, de ver novas representantes, de renovação de práticas onde “não seja tudo igual”. Porém, com medidas como estas a mídia justamente mantém o espaço já conquistado de figuras com grande exposição por eleições anteriores, cargos no governo etc. A imprensa neste sentido age na contramão de um direito humano, que é o direito ao acesso à informação. É o machismo aliado ao esforço de inviabilizar partidos pequenos e aguerridos  que travam batalhas importantes contra os grandes partidos da ordem.

 

É urgente a discussão sobre a promíscua relação  das empresas de comunicação com políticos e partidos da ordem, mais grave ainda, em se tratando de empresas públicas.  É urgente a discussão da perpetuação das desigualdades de gênero na grande imprensa. O Brasil está na lanterna (161ª posição) de um ranking de 186 países sobre a representatividade feminina no poder executivo, atrás de todos os outros países do continente americano. É preciso assegurar uma maior participação das mulheres na política e os meios de comunicação podem e devem também contribuir para isso. Estamos atentas e vamos ocupar todos os espaços da política, enfrentando o machismo estrutural e violento que atua em nossa sociedade.

 

*Lisete Arelaro é professora titular da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, instituição que dirigiu, eleita por voto direto de 2010 a 2014. Fez parte da equipe de Paulo Freire na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo,  na gestão Luiza Erundina. Foi por duas vezes Secretária Municipal de Educação, Cultura Esporte e Lazer de Diadema. É Pré-Candidata pelo PSOL ao governo do Estado de São Paulo

 

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Baronesa https://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/2018/06/28/baronesa/ https://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/2018/06/28/baronesa/#respond Thu, 28 Jun 2018 20:08:17 +0000 https://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Andreia-01-320x213.jpeg http://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/?p=1491

Por Juliana Antunes

Belo Horizonte tem vários bairros com nome de mulher e a maioria deles nos leva para a periferia. Em 2008, quando me mudei do interior de Minas para a capital, recebi a seguinte instrução: os ônibus azuis, eu poderia pegar quase todos, mas deveria ter cuidado com os vermelhos, pois eles iam “pro outro lado da cidade”. Os anos foram se passando e o interesse de tornar a experiência dos ônibus vermelhos em filme se consolidou durante o meu trabalho de conclusão de curso (Cinema e Audiovisual – UNA).

 

Comecei a visitar os bairros procurando por mulheres que estivessem interessadas em participar de um filme usando um método de abordagem clássico: saí, junto com mais duas amigas (Marcela Santos e Giselle Ferreira) pregando cartazes nas ruas com os dizeres: procuram-se mulheres interessadas em fazer um filme. Resultado pífio, quase nenhum retorno, exceto por um cartaz colado ao lado de um salão de beleza. A partir daí, se formou um dispositivo: mulheres que trabalham e ou/frequentam salões de beleza e moram em bairros com nomes femininos. O “salão da Pâmela” se tornou o meu ponto de partida para o roteiro que se baseava no cotidiano do salão e da comunidade.

 

Em uma tarde no salão da Pâmela, Andreia (protagonista do filme) entrou, experimentou uma blusa, me fitou no espelho e saiu. Por intuição, comecei a procurar por ela – que não havia  concordado em fazer um filme a priori. E ela, depois me disse: chegou a se esconder debaixo de um carro pra não ser encontrada por mim.

 

Foi em Agosto de 2015 que houve uma virada. Estávamos filmando Pâmela, quando Andreia resolveu nos dar uma cena na qual ela fazia as unhas de uma cliente. Mostrei o material filmado para ela e afirmei: você é uma grande atriz. Andreia topou fazer o filme com a seguinte condição: a de que eu vivesse na favela, pois ela não poderia me dar todo o seu tempo e nem saber com antecedência quando poderia gravar.

 

Aluguei um barracão de 30m para morar sozinha e lá fiquei por quatro meses, com visitas semanais da equipe. A chegada à Vila Mariquinha não foi tranquila e a maioria das pessoas, sobretudo Andreia, pensavam que eu era uma agente policial infiltrada. No exato dia da minha mudança, uma guerra de gangues rivais se anunciou e mudou completamente os rumos do projeto: um filme sobre salões de beleza daria lugar à uma rotina áspera e entrincheirada. A nossa presença na favela e na casa da Andreia atraiu Negão e Leid, vizinho e cunhada, respectivamente, que entraram de uma maneira muito orgânica no projeto que foi filmado de uma maneira diferente da lógica tradicional aplicada ao mercado de cinema. Algumas cenas eram ensaiadas e gravadas várias vezes. Outras se davam pelo risco do real.

 

O fato de estarmos em uma equipe reduzida e majoritariamente feminina fez do nosso encontro um filme com mulheres na construção conjunta: na frente e atrás das câmeras – o que estabeleceu outros parâmetros de organização da equipe, de possibilidade de fazer cinema, pois não só a história se reconfigurou, mas a narrativa também acabou dando a ver essa invenção de lugar comum – que não eram nem da equipe, nem das atrizes: foi um lugar comum que inventamos e que implicou na invenção de uma relação.

 

O material bruto gerado dos meses de imersão era extenso. Foi aí que o realizador Affonso Uchoa (A vizinhança do Tigre e Arábia) se debruçou em mais 60 horas de um material irregular e complexo. Assistimos, juntos, todas as imagens a fim de encontrar um rumo para o filme, que, apesar de indicações de um roteiro prévio, não estava completamente definido. Meses de trabalho nos levaram a uma escolha de 15  horas de material bruto e indicavam caminhos de filmes possíveis. E foi neste momento que a montadora Rita Pestana entrou no projeto e somou forças ao filme que se deve muito ao trabalho de montagem.

 

E bem, sempre fica a pergunta: é documentário ou ficção? Pra mim, toda ficção tem muito de documentário e todo documentário, tem ficção. Costumo dizer que Baronesa é um filme de “não atrizes” feito por uma “não diretora” e uma “não

equipe”. Foi a primeira vez de todo mundo no cinema. Andreia e Leid são grandes atrizes, só não tiveram oportunidades na vida de se destacarem como tal, assim como a maioria mulheres da equipe não haviam tido oportunidade de trabalho no mercado de trabalho, pois estavam no começo de carreira de uma uma profissão que ainda opera em lógica ainda muito masculina.

 

Baronesa foi selecionado para mais de 50 festivais nacionais e internacionais. Premiado nos festivais de Tiradentes (Brasil), FID Marseille (França), Havana (Cuba), Mar del Plata (Argentina), Indie Lisboa (Portugal), Valdívia (Chile) e Ourense (Espanha), o filme está em cartaz pela SESSÃO VITRINE em várias salas de cinema pelo país. O maior desafio do cinema nacional é a distribuição e conseguir colocar o filme em cartaz é algo que nos deixa extremamente felizes. Para que Baronesa tenha um vida em cartaz, é preciso que as pessoas ocupem as salas e falem do filme para as amigas e amigos e postem nas redes sociais, pois um filme tão independente precisa do “boca a boca” para chegar às pessoas.


Juliana Antunes é cineasta

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