O FÓRUM M: saber legítimo, epistemologia potente

Por Heloísa Buarque de Hollanda*

A Universidade hoje está sob pressão. Pressão econômica, pressão à liberdade de ensino e expressão,  pressão aos estudos e às identidades de gênero. É urgente que questões sob censura autoritária e conservadora – como a que se refere aos temas chamados erroneamente de “ideologia de gênero” – avancem e mostrem seu potencial transformador e produtivo nas ciências exatas e humanas, nas artes, nas letras, assim como na política.

O Feminismo não é uma ideologia. É simplesmente uma luta por direitos iguais na política, no mercado, na vida privada. É uma política de autodefesa contra a violência doméstica, contra o feminicídio,  a favor da liberdade de expressão e da liberdade sobre o próprio corpo. São apenas direitos fundamentais que pedimos. 

A confusão da defesa de direitos fundamentais com a noção de ideologia é  absolutamente nociva e perversa e tem levado à desqualificação de uma luta indispensável para a convivência democrática. Daí a importância e a urgência da tarefa de aprofundar e divulgar o pensamento feminista como um saber legítimo e como epistemologia potente. Falamos sobre reunir o movimento feminista e a universidade, e convidar todas e todos para uma reflexão sobre quem somos e quem querendo ser. É isso que move a parceria inspirada que reúne o Laboratório de Teoria e Práticas Feministas da UFRJ, o Fórum Ciência e Cultura, também da UFRJ, é o Agora É Que São Elas.

O pensamento feminista, que começa a se  formalizar como conhecimento acadêmico na década de 1980,  já produziu mudanças decisivas nas formas de percepção da vida e do mundo social.  Várias correntes e posições políticas dialogam nesse universo com a missão de interpelar a  objetividade científica enquanto valor acadêmico, e valorizar a experiência social da mulher como constituinte das perspectivas epistemológicas, científicas,  e metodológicas .

Ou, como chama a atenção a professora emérita da Universidade da Califórnia e autora de Manifesto Ciborgue, Donna Haraway, a importância de defendermos a noção de ponto de vista epistemológico enquanto conhecimento situado em oposição a um relativismo aparente deste mesmo ponto de vista. É essa a função social e política da produção teórica feminista: reivindicar o fim das injustiças epistemólogicas e pensar as perspectivas de um mundo mais justo.

Apesar destes estudos estarem se desenvolvendo em  profundidade e rapidez, eles têm se confinado no mundo fechado das universidades, seminários e grupos de estudo.  O cruzamento entre o ativismo feminista e as teorias feministas é um caminho eficaz para a ampliação não apenas das práticas feministas mas também da própria produção de conhecimento acadêmico. A articulação teoria e prática, infelizmente tão rara, pode ser o caminho que nos falta para enfrentar esse momento difícil para o feminismo.

Foi com essa meta que o Laboratório de Teoria e Práticas Feministas do Programa Avançado de Cultura Contemporânea (PACC) Letras/ UFRJ, associou-se ao Fórum de Ciência e Cultura,  espaço de estudos superiores e debates da UFRJ e ao #AgoraÉQueSãoElas, um dos mais importantes polos do ativismo feminista da web. 

 Essa articulação  pretende levar e discutir o pensamento feminista em espaços abertos, gratuitos e democráticos para que o pensamento feminista, suas teorias e narrativas , sejam debatidos  nas universidades e em pontos estratégicos do centro e das periferias do Rio de Janeiro. O Fórum Mulher é esse espaço político acadêmico e político que vai invadir a cidade e o universo das mídias sociais. 

*Heloísa Buarque de Hollanda é Coordenadora do Programa Avançado de Cultura Contemporânea da UFRJ e desenvolve o laboratório de tecnologias sociais da Universidade das Quebradas. Recentemente, publicou o “Explosão Feminista: Arte, cultura, política e universidade” (Cia das Letras).