Mulheres na linha de frente

#AgoraÉQueSãoElas
*por Fernanda Melchiona
Vivemos uma crise mundial na qual os governados não se sentem representados por seus governantes. Sem risco de exageros, podemos dizer que vivemos a Era da Desrepresentação.
Diante da falência do modelo econômico em que o capital financeiro impõe suas regras e sufoca as conquistas democráticas dos povos e da falência de uma esquerda que decidiu governar com o modus operandi do toma lá, dá cá, um setor do povo escolheu o que de pior existe neste regime apodrecido, acreditando estar votando contra o sistema.
No entanto, nesse interregno onde, como diz Antonio Gramsci, “o velho está morrendo e o novo ainda não pode nascer”, inúmeros movimentos emergiram no cenário político, como a onda de 2011, que varreu em dias ditaduras de décadas no mundo árabe e as Jornadas de Junho no Brasil, em 2013, com uma ofensiva em defesa da democracia real e das liberdades civis.
Nesse cenário, as mulheres têm sido linha de frente na contestação ao establishment, apontando a necessidade da construção de um projeto alternativo de sociedade. Isso explica, nos Estados Unidos, a eleição da jovem da periferia do Bronx, Alexandria Ocasio-Cortez, à Câmara de Representantes e das demais 101 mulheres ao Parlamento norte-americano. Felizmente, na contramão desse conservadorismo também tem crescido o pólo contrário, radicalmente democrático, feminista e anticapitalista que tem como expressão a ascensão dos Socialistas Democráticos da América (DSA, em inglês), que hoje são o maior movimento socialista no coração do capitalismo mundial.
No Brasil, o forte aumento da bancada feminista do PSOL é parte deste processo.
Nessa última semana estive na Califórnia, Nova Iorque e Washington ao lado de parlamentares eleitas pelo PSOL para debater a importância do feminismo na resistência ao crescimento da extrema-direita no mundo e para conectar as nossas experiências e lutas contra a barbárie que os conservadores querem impor aos direitos da população e das mulheres. Reivindicamos o internacionalismo como marca do projeto anticapitalista e socialista que queremos construir. Afinal, se o projeto da classe capitalista dominante é internacional, a nossa resistência também será.
Um sistema que faz com que apenas 26 bilionários tenham a mesma renda que 3,8 bilhões de pessoas, é insustentável. Temos um esforço coletivo de apontar um programa alternativo. Por isso, defendemos um feminismo interseccional, antirracista, LGBTI, classista, que representa os interesses da classe trabalhadora e que não aceita essa lógica do capital acima da vida.
Nós, brasileiras, temos que nos inspirar no processo de resistência e luta que as norte-americanas travaram ao longo desses três anos de governo Trump: uma luta que transcende os direitos das mulheres e que luta por justiça e igualdade social. Por exemplo, as professoras de Los Angeles foram protagonistas de uma greve vitoriosa contra a privatização do ensino público de educação e por melhores condições de trabalho, inspirando diversas outras cidades que já preparam movimentos grevistas.
Está nas nossas mãos construir um grande Março de lutas, com força no Dia Internacional da Mulher (8 de Março), e no completar de um ano do assassinato da nossa companheira Marielle Franco (14 de março). A cada dia de silêncio pela morte de Marielle aumenta a impunidade e potencializa novos crimes políticos. Articulamos internacionalmente uma campanha para fortalecer a luta por Justiça para Marielle, denunciando na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em Washington a ausência de respostas do Estado brasileiro diante do caso.
Se a eleição de Bolsonaro colocou o Brasil na rota internacional de crescimento da extrema direita, cabe a nós colocarmos o nosso feminismo na ofensiva internacional. O #EleNão, maior mobilização feminista na nossa história, já demonstrou que as mulheres brasileiras não se resignarão às bravatas da extrema-direita.
* Fernanda Melchionna é Deputada Federal do PSOL e esteve na última semana nos Estados Unidos articulando uma campanha internacional de Justiça por Marielle.