Violência contra Mulheres na Política: “Bastidores da luta contra a PEC 181” por Luiza Erundina

#AgoraÉQueSãoElas

Por Luiza Erundina*

Hoje a PEC 181 volta a ser discutida na comissão da câmara dos deputados. A imagem dos deputados, todos homens, comemorando aos risos o avanço sobre os direitos das mulheres chocou o país. Tanto por sua perversidade, quanto ser ocupada apenas por homens.

Como já descrito em textos anteriores neste espaço, a PEC que originalmente propõe ampliar a licença maternidade para a mulher trabalhadora em caso de nascimento prematuro, já aprovada pelo Senado Federal por unanimidade, foi modificada na sua essência em uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados. O relator, deputado Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP), apresentou um substitutivo que incorpora no texto emendas não submetidas à CCJC, e alheias ao propósito original do autor da PEC.

Conforme o substitutivo apelidado de “Cavalo de Troia”, a interrupção da gravidez em qualquer hipótese estará proibida – inclusive nos casos já permitidos pela legislação penal brasileira desde os anos de 1940. O novo texto, apresentado pelo relator de forma sorrateira, inclui na Constituição Federal a premissa de que a vida se inicia com a concepção, tese já afastada pelo próprio STF.

Essa alteração se reveste de muita gravidade, face às enormes dificuldades que as mulheres enfrentam hoje, particularmente as mulheres trabalhadoras, até mesmo para exercer o direito de interromper uma gravidez nos limites da legislação em vigor. Será mais uma violência contra elas, contra nós, cometida pelo próprio Estado.

Além do próprio substitutivo sorrateiro, foram aplicadas diversas manobras regimentais pelo Presidente da Comissão Especial, deputado Evandro Gussi (PV-SP), para garantir sua aprovação.

Uma das manobras do presidente da Comissão foi impedir que eu e a deputada Jô Moraes (PCdoB-MG) votássemos, pois ele sabia que os nossos votos seriam contrários à aprovação da matéria. A reunião da Comissão, que começara ao meio dia, foi interrompida às 15h30 devido ao início da Ordem do Dia, exigindo que nós, deputados e deputadas, nos dirigíssemos ao plenário da Câmara para votar. Duas horas depois, por volta das 17h30, antes de chegarmos ao plenarinho, onde acontecia a reunião da Comissão, o presidente retomou os trabalhos e colocou apressadamente a matéria em votação – o que é grave, pois tanto eu quanto a deputada Jô Moraes somos parte da comissão e, devíamos estar presentes. Ao saber que a PEC estava em votação, saí do plenário apressada, em direção a sala onde a comissão estava reunida – que não fica perto. Caminhei o mais rápido possível. A votação foi fechada e aprovada com um único voto contrário, o da deputada Érika Kokai (PT-DF), sem o registro dos outros dois votos contrários, não obstante os nossos protestos e indignação.

Deste modo, a votação da PEC 181 na tarde do dia 8 de novembro de 2017, pelo seu conteúdo e processo de tramitação, é um significativo exemplo do que é ser mulher na política e das violências, concretas e simbólicas, às quais estamos sujeitas.

Práticas e atitudes autoritárias como essas, remontam aos tempos nefastos de Eduardo Cunha, cujo legado continua vivo no comportamento de seus fiéis seguidores que retomam seus projetos contra as mulheres, como, o “estatuto do nascituro” e a “bolsa estupro”.

Esperemos que a matéria seja rejeitada pelo Congresso Nacional em resposta ao que demanda a sociedade brasileira, cuja maioria, segundo pesquisas recentes de importantes institutos, entende que são as mulheres que devem decidir sobre essa e outras questões que lhes dizem respeito.

Portanto, não é razoável que o Parlamento, e uma Comissão, constituídos majoritariamente por homens machistas, misóginos, fundamentalistas, e envolvidos nas investigações da Lava-Jato, com raras e honrosas exceções, decidam sobre questões que dizem respeito direta e exclusivamente à vida das mulheres que somos mais da metade da população brasileira.

*Luiza Erundina é deputada federal pelo PSOL