Arremedo Político

#AgoraÉQueSãoElas

Por Jandira Feghali*

As discussões sobre a necessária reforma política, lamentavelmente, se concentram em pontos que visam restringir o acesso à tão sonhada representatividade plena no Congresso Nacional. Mulheres, que são maioria na sociedade, se tornam minoria na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Apesar de nossa Constituição inscrever a igualdade de todos perante a lei, essa parcela majoritária encontra todo tipo de barreiras em seu caminho para um cargo eletivo.

Distritão, distrital misto e cláusula de barreira, longe de uma solução para a falência de nosso sistema eleitoral, implicarão em resultados distintos dos que se deseja para o avanço da democracia. Eles são, na verdade, um retrocesso. Uma verdadeira armadilha a rondar nossa expectativa de alcançar uma representação que encontre paralelo na composição da sociedade.

Vale destacar a relação dos regimes autoritários com a implementação de sistemas de votação majoritário e cláusulas de barreira, como o “distrital”. Este, para se ter ideia de quanto arcaico é, vigorou entre o Império e a República Velha, privilegiando diretamente as oligarquias. Já o distrital misto vigorou durante a Ditadura, introduzido no Brasil pelo general Figueiredo e que se tenta emplacar por aqui há 35 anos.

O voto proporcional, por sua vez, floresceu em períodos que nossa democracia estava vigorada, como na revolução de 1930, permitindo a criação da Justiça Eleitoral, do voto secreto e do voto feminino, além da construção da Constituição Federal de 88.

Estas são marcas profundas e históricas da democracia brasileira. O sistema proporcional garante a representação plural da sociedade, como as minorias e o pluripartidarismo. Os partidos menores, ideológicos e de esquerda, que tem responsabilidade orgânica com a representação das mulheres, não se fazem representar no distritão e distrital misto.

Para os que acompanham de fora pode parecer que tais propostas, mesmo que ruins, estejam prevalecendo pela ausência de outras melhores. Mas não é o que acontece.

Tramita na Câmara, desde setembro de 2015, a Proposta de Emenda à Constituição nº 134 que assegura a cada gênero, masculino e feminino, percentual mínimo de representação nas cadeiras da Câmara, das Assembleias, da Câmara Legislativa do DF e das Câmaras Municipais, em três legislaturas a partir de sua promulgação.

A ocupação seria gradativa: 10% das cadeiras na primeira legislatura; 12% na segunda legislatura; e 16% na terceira legislatura. A PEC é tímida, porém um avanço numa correlação de retrocesso dentro do Parlamento. Importante para, no caso das mulheres, diminuirmos o abismo que ainda persiste em todas as esferas de nosso sistema representativo. Afinal, somos quase 52% da população.

O tema é bandeira da bancada feminina no Parlamento, que tem sido incansável em sua defesa. Deputadas e senadoras de vários partidos estão engajadas nesta luta, mas precisam que suas vozes encontrem eco numa Casa que parece mais interessada num arremedo político que numa verdadeira e democrática reforma.

Do direito ao voto, em 32, até hoje passamos por diversos estágios. Tivemos a Lei de Cotas e a exigência para que partidos incluíssem em seus programas de TV conteúdos que incentivassem a participação feminina na política. Os avanços, no entanto, não foram suficientes para garantir a igualdade de acesso. Aprovar a PEC 134 é enfrentar uma ideologia patriarcal de dominação que submete as mulheres à desigualdade na vida e nas relações de poder. É respeitar seu direito de participar e decidir na vida pública. É superar uma injustiça que já perdura tempo demais. Afinal, já estamos no século XXI.

*Jandira Feghali é médica, deputada federal (PCdoB/RJ) e vice-líder da oposição.