Mão-boba nada boba
Por Maria Lucia Rangel*
O funkeiro MC Biel não se sentiu nada intimidado com a plateia de jornalistas ao agredir a repórter do IG. Ela preferiu ficar incógnita mas deu parte à polícia das barbaridades que ouvir do cantor de 20 anos que prefere se definir como “menino, menino que brinca, menino sem papas na língua, menino que sorri”. Vamos ver se ele vai sorrir se for condenado pela Justiça.
Volto no tempo, mais especificamente à redação do Jornal do Brasil dos anos 70, na Avenida Brasil. Claro que também lá havia assédio sexual. Muitas vezes mascarado por uma cantada ou uma paquera mais tátil, digamos assim. E raramente com testemunhas. A grosseria – como a praticada por Biel – acontecia geralmente de cima pra baixo, com um “poderoso” constrangendo uma funcionária. As repórteres, resguardadas por seu status–naquele tempo assinar matéria em jornal era como mostrar a cara na Globo—raramente eram atacadas pelos marmanjos de descontrolada libido.
O assédio sexual mais escandaloso e comentado que aconteceu no JB foi protagonizado pelo jornalista Isaías Pilsen (nome fictício). Ele com um currículo profissional alentado e já beirando os 50 anos: secretário da revista Joia, na Bloch Editores; diretor-executivo da revista Seleções, em Portugal; um dos produtores do primeiro programa de TV sobre Israel – Israel em foco – e tradutor. Cheinho, careca, feio, simpático para alguns, era como o via. Adorava o Zózimo e vivia em sua sala contando casos. Não era um jornalista amigo da redação, que saísse para um chopp ou fosse convidado para uma de nossas festas. Sempre preferiu os colunistas.
Certo dia começou a correr um boato que Pilsen havia assediado a secretária que fiscalizava o hall dos elevadores do 6º andar, exatamente o andar da redação. A moça, loura e muito jovem, estava em sua mesa de trabalho quando o jornalista primeiro se aproximou com um papo insinuante—e de repente, sem mais nem menos, passou-lhe a mão num dos seios. Apesar de perplexa com o ocorrido, a vítima denunciou o assédio à redação, cuja solidariedade foi imediata. Durante uma semana só se falou disso no jornal—e também em outras redações. Pilsen passava cabisbaixo pelos corredores, na vã tentativa de comprar a indulgência dos colegas, mas sua chantagem sentimental não colou.
E o que aconteceu? A secretária foi demitida. Sumariamente. Em pleno anos 70 de Leila Diniz, ela foi pra rua. A vingança resumiu-se ao apelido que caiu como uma luva em Pilsen: Amigo do peito. Ele morreu há alguns anos e até hoje todos só se lembram do apelido. Nada mais justo.
Minha experiência é mais amena. Estava na Academia Brasileira de Letras preparando uma matéria sobre o chá das quintas-feiras. Entrevistava cada acadêmico quando um deles, quando estávamos sozinhos numa imensa sala, sentou-se no braço da minha cadeira e começou a passar a mão no meu rosto. Um carinho mal intencionado, percebi. Fiquei mais surpresa do que zangada, achando ridículo aquele velhinho pensar que a menina que eu era aceitaria aquele gesto passivamente. Levantei-me, disfarcei e saí. Com pena dele.
* Maria Lucia Rangel é jornalista